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terça-feira, 2 de janeiro de 2018

Tratamento Espiritual & Tratamento Psicanalítico

Uma comparação para uma compreensão


Muitos Cristãos estão recorrendo ao consultório psicanalítico para tratar seus problemas emocionais, haja vista, o número de “pastores” sem preparação teológica, e muito menos para lidar com os problemas emocionais das pessoas que recorrem à igreja em busca de refrigério para os anseios da alma.
O movimento celular defende que cada pessoa é um líder, e, ao conseguir reunir um pequeno grupo, esse líder sai do ministério que pertence com meia dúzia de pessoas, monta sua igreja própria e se auto intitula “pastor”.
O mesmo acontece nos movimentos pentecostais e neopentecostais, onde não há requisito ou critério na ordenação pastoral.
A busca de uma vida espiritual elevada por meio da oração, do jejum e busca de poder, são as condições fundamentais para o desenvolvimento espiritual, sem nenhum ensino referente ao tratamento da alma.
O pecado é tratado a base da repressão e da censura do pecador, sem nenhuma compreensão de psiquê e o comportamento como pecado.
Pense sobre o quadro abaixo:

Na Igreja                                                              Na clínica Psicanalítica

Alma                                                                     Psiquê
Pecador                                                                Paciente
Pecado                                                                 Comportamento
Santificação                                                          Repressão/Recalque
Consagração                                                        Tratamento/Terapia
Santidade                                                              Cura da alma.

Nesse movimentos, nenhum pastor é obrigado a ter conhecimento psicoterapêutico, mas, no mínimo, deveria conhecer a tricotomia que compõe o ser humano, e buscar conhecimento sobre os tratamentos do corpo e da alma.
A teologia transmite a compreensão das escrituras, e, apesar de a bíblia tratar amplamente sobre a alma, poucos são os líderes que estão preparados para lidar com ela.

Alma: Psiquê - “Tão-somente guarda-te a ti mesmo, e guarda bem a tua alma...” Dt.4.9. A expressão alma é um termo que no hebraico do Velho Testamento é - néphesh: dá o sentido literal de “respiração da vida”; No grego do Novo Testamento é psykhé: termo que indica a vida física e racional do homem. Etimologicamente, deriva do termo latino animu (ou anima), que significa "o que anima". Seria a fonte da vida de cada organismo, sendo eterna e separada do corpo. Alma não é o mesmo que espírito.
Na Bíblia, os vários sentidos da palavra alma, tais como - sangue, coração, vida animal, pessoa física, etc., devem ser interpretados segundo o contexto da escritura em que está contida a palavra “alma”.
Em relação ao ser humano, a alma é o princípio inteligente que anima o corpo e usa os órgãos e seus sentidos físicos como agentes na exploração das coisas materiais, para expressar-se e comunicar-se com o mundo exterior.

Pecador: espiritual e teologicamente falando, o termo faz referência àquele que comete pecado.
Na psicoterapia, o pecador é recebido e tratado como um paciente, como uma pessoa que precisa aprender a lidar com suas atitudes, e, principalmente com o sentimento de culpa, que, em muitos casos, é o fator predominante das doenças emocionais.

Pecado: O pecado é uma ação “voluntária” ou não, que fere princípios da vontade e da palavra de Deus.
No estudo psicanalítico do comportamento, compreendemos o pecado como atitudes, fruto da formação do caráter, da identificação familiar, da formação dos conceitos, podendo ser ações conscientes ou inconscientes - instintivas.
O objetivo da psicoterapia é conhecer a psiquê, afim de tratar a origem do comportamento e dos traumas, que são responsáveis por comportamentos e a repetição de pecados, que muitas vezes fogem à compreensão.
Apesar de tratar o pecado como comportamento, o terapeuta cristão consegue fazer o devido ajustamento dos termos, sem minimizar o mal espiritual do pecado.

Santificação: na teologia é o processo que leva à uma forma de vida onde o indivíduo tem o domínio sobre o pecado.
Devido à falta de preparação e conhecimento, a maioria dos líderes evangélicos, tentam levar os cristãos à santidade, mais por repressão ou recalque do que por convencimento de uma vida santa para Deus.

A repressão é o processo psíquico através do qual o sujeito rejeita determinadas representações, ideias, pensamentos, lembranças ou desejos, submergindo-os na negação inconsciente, no esquecimento, bloqueando, assim, os conflitos geradores de angústia.

O Recalque: Denota um mecanismo mental de defesa contra ideias que sejam incompatíveis com o eu.

Consagração: prática do jejum e da oração como forma de obter maior intimidade com Deus, resultando numa vida mais pura, santa e cheia de poder e unção do Espírito Santo.
Essa dedicação é, por si só, uma forma de vencer todos os sofrimentos físicos e espirituais - o Diabo e seus demônios, e vencer todos os traumas e males emocionais e mentais.
Na psicoterapia, quando a pessoa reprime/recalca seus sentimentos, desejos e culpas, se utilizando de mecanismos de defesa como a sublimação ou a negação, simplesmente está gerando uma somatória de sentimentos de culpa, desejos e desconfortos emocionais e psicológicos, tornando-se um vulcão pronto a uma erupção.
Num determinado momento, um gatilho emocional pode desencadear uma série de distúrbios, provocando ataques de ansiedade, depressão, culpa ou vergonha.
Pode ser difícil identificar o que exatamente é um gatilho emocional, mas a melhor forma de curá-lo ou lidar com ele, é conhecer os traumas que o causaram.
Todos, quando criança, inevitavelmente experimentam dores ou sofrimentos que não reconhecem e nem sabem como lidar com eles. Quando adultos, criam gatilhos para as experiências que lembram esses momentos dolorosos vivenciados na infância, como forma de melhor gerir esses sofrimentos.
Identificar os gatilhos, é o primeiro passo para curá-los. 
Mesmo o cristão mais espiritual tem gatilhos que, em dado momento, podem ser acionados, desencadeando sentimentos e comportamentos.
A ameaça de Jesabel ativou um gatilho mental/emocional em Elias, levando-o a uma depressão profunda.

Santidade: no hebraico – Kadoshi, no grego “agios” que na origem significa separado. No AT, está mais relacionada ao ritualismo, tanto do sacrifício como a pureza do “imundo”: lepra, animais impuros, tocar o morto ou o período menstrual da mulher. Em Is.1.11-17, santidade volta-se para além do ritualismo e passa a ser visto como uma mudança de comportamento. No NT, a expressão santidade ganha o verdadeiro sentido. Mt.15.11,18,19 afasta definitivamente o imundo (ritualismo), para a verdadeira santidade: a pureza dos pensamentos e das palavras.
A santidade está mais ligada à cura da alma do que ritualismos e proibições. Dai porque os crentes estão encontrando mais satisfação e bem estar nas terapias do que nos cultos.
Na igreja, em geral, o pecador não é bem visto, normalmente é recriminado, censurado e sentenciado ao inferno. Se o cristão, membro de uma igreja pecar, estará debaixo do julgamento dos demais.
Muitas vezes, o gabinete pastoral é a instância final do julgamento e da sentença, dai o porque de muitos cristãos estarem vivendo sérios problemas emocionais. Não são tratados e sofrem de elevado sentimento de culpa pelos pecados escondidos.
Dependendo da forma que for avaliado por seu líder espiritual, muitos preferem não mais confiar seus conflitos e pecados, e passam a viver sua luta contra o pecado sozinho.
No consultório psicanalítico, o mesmo pecador é ouvido sem censura, sem repressão, mas como uma pessoa que precisa ser tratada.
O terapeuta irá atuar no tratamento da psique (alma), para compreender o comportamento (pecado) e tratar as feridas emocionais (sentimento de culpa), que provoca doenças emocionais e psíquicas.
Como mencionei acima, quando se trata de psicoterapeuta cristão, o pecado, apesar de tratado como comportamento, não perde a condição de pecado, o que não acontece com um terapeuta que não tem uma percepção da fé cristã.
Pessoalmente recomendo que um cristão que busque ajuda profissional na área de psicoterapia, deve, antes de iniciar seu programa terapêutico, conhecer o profissional, que é, por questões éticas, obrigado a respeitar as crenças do paciente.
Assim, os “pastores” deveriam ter, no mínimo, uma base de conhecimento na área terapêutica, para identificar os sintomas de distúrbios emocionais e comportamentais, para melhor desenvolver seu chamado ministerial e, verdadeiramente, ser um cuidador de almas. Esse conhecimento, contribuiria - e muito, no equilíbrio emocional do próprio pastor e na saúde emocional e mental de seus familiares.
Observemos que os suicídios de pastores ocorridos recentemente, são, em sua maioria, pastores extremamente pentecostais, a ramificação evangélica com maior rejeição aos tratamentos psicoterapêuticos e os que mais espiritualizam as doenças emocionais.
Não estou aqui generalizando, mas vejo com preocupação o quadro emocional da igreja, e, principalmente, dos que estão à frente do rebanho de Deus.
O julgamento desses movimentos é tão absurdo, que muitos já condenaram os pastores que cometeram suicídio, ao inferno, e atribuem ao diabo o suicídio, e que esses suicidas estavam em pecado. Descartam qualquer quadro de distúrbio emocional, como se esses líderes não fossem humanos.
Como psicanalista e psicoterapeuta, li detalhadamente todos os casos de suicídio de pastores e padres nos últimos três anos, e, com exceção de um padre e de um pastor (que não foram mencionados distúrbios emocionais ou psicológicos), os demais encontravam-se sob tratamento da depressão.

Osésa Rodrigues de Oliveira
Pastor e Psicanalista Clínico

Pós Graduado em Psicanálise Clinica.

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