Uma mãe, preocupada com o comportamento do pai ao
beijar a boca do filho, um bebê de 3 anos, me enviou uma pergunta: O beijo na
boca da criança passa uma mensagem?
A preocupação
da mãe faz sentido. Mesmo sendo um ato de carinho e inocente, a criança pode estar
recebendo uma mensagem distorcida, já que não tem a mesma percepção do pai.
O questionamento é oportuno, visto a ampla repercussão
do ocorrido no BBB, onde um pai beijou a filha no reality show, provocando
repúdio na sociedade brasileira, embora, para aquela família “isso fosse
natural”.
Então, vamos a resposta.
O período mais importante da formação da criança é a
primeira infância, que vai desde o nascimento até aos seis anos de idade,
quando as áreas fundamentais do cérebro são desenvolvidas: A área do caráter, da
personalidade, das emoções, dos contatos interpessoais, da aprendizagem e etc.
É nesse período que a criança aprende a se
relacionar e desenvolver importantes valores, principalmente em suas relações
na família, na escola e na comunidade.
“Durante o primeiro ano de vida, o
ser humano aprende 50% de tudo que virá a aprender na vida e, no segundo ano,
aprende mais 25%. Ou seja, nos dois primeiros anos de vida, o ser humano
aprende 75% de tudo que um dia virá a aprender. Obviamente, parte desse
aprendizado envolve aspectos motores e físicos como sentar, andar, mastigar,
falar, etc., mas também aspectos de ordem emocional, intelectual e espiritual.
Assim, ao terceiro ano de vida, grande parte do caráter já está formado e aos
sete anos está concluído”.
Dados
publicados em: Rockey, Ron e Nancy, Chosen Nampa, Idaho: Pacific Press
Publishing Association, 2001) p. 117).
Pesquisas científicas realizadas nos últimos 100
anos, comprovam que a primeira infância é um período decisivo na formação da
personalidade, do caráter e do modo de agir do adolescente e do adulto.
É, à partir das experiências vividas na infância, que
o mapa da realidade é construído. Para isso, é preciso oferecer à criança ambiente
familiar saudável e estável, bons
modelos de identificação, atenção e estruturas sociais confiáveis, que
estimulem seu desenvolvimento e o aprendizado
de valores.
A formação da mente na Neurociência - a Neurociência
oferece evidências de que acontecimentos precoces de natureza física,
emocional, social e cultural permanecem inscritos nas pessoas por toda vida.
Até próximo aos três anos de vida, a criança se
ocupa da concretude do mundo. O fazer e tocar são as formas com que seu
vocabulário de símbolos se constrói. O passo seguinte, por volta dos quatro e
cinco anos, é o da abstração do pensamento e internalização dos símbolos, em
que a criança se ocupará do pensar e a linguagem interna construirá o elenco de
símbolos e significados que farão parte do seu arcabouço do imaginário e
fantasia.
A Psicanálise e a sexualidade
infantil – Temos visto o quanto que a psicanálise tem como um de seus
operadores centrais uma compreensão inovadora da sexualidade humana. Por meio
dos conceitos, como zona erógena, pulsão e libido, a sexualidade representa-se
como porta de entrada para o
entendimento da vida psíquica. Com a ideia da pulsão sexual, que de forma
diferente do instinto sexual, não se limita às atividades da sexualidade
biológica, mas demarca o fator primordial que estimula toda a série de
manifestações psíquicas, Freud autoriza uma inovadora e revolucionária
compreensão da sexualidade humana.
Lembremos que, ao se tratar da psicanálise,
precisamos entender que Freud não via o sexual no mesmo sentido em que o senso
comum da época. Ele propôs a desconstrução da ligação existente entre o sexual e o genital. Seu questionamento se baseava em como e o que constitui a
sexualidade nos fenômenos humanos.
Assim, é de suma importância que entendamos a
diferença existente entre “sexo” e “sexualidade”. Cientistas sexuais, a
partir da década de 70, convencionaram o termo sexo para se referir à divisão
biológica entre macho e fêmea. Tal palavra também serve como referência aos
órgãos sexuais, tanto masculino (pênis) quanto feminino (vagina). Enquanto
isso, a sexualidade vai além das partes do corpo, organizando-se como um
predicado presente não só na cultura como na história do homem. Contudo, a
sexualidade envolve prazer, relações sociais, procriação e sublimação.
“A sexualidade
forma parte integral da personalidade de cada um. É uma necessidade básica e um
aspecto do ser humano que não pode ser separado dos outros aspectos da vida.
Sexualidade não é sinônimo de coito e não se limita à presença ou não do
orgasmo. Sexualidade é muito mais do que isso, é a energia que motiva a
encontrar o amor, o contato e a intimidade e se expressa na forma de sentir, na
forma das pessoas tocarem e serem tocadas. A sexualidade influencia pensamentos,
sentimentos, ações e interações e tanto a saúde física como a mental. Se a
saúde é um direito humano fundamental, a saúde sexual também deveria ser
considerada como um direito humano básico.” (OMS, 1975,
apud EGYPTO, 2003, p. 15 e 16)
Podemos, inclusive, ressaltar que para a psicanálise
o objetivo sexual tido como normal é aquele onde ocorre o encontro dos órgãos
genitais capaz de levar ao alívio de tensão sexual e, ao mesmo tempo, a uma
extinção temporária do instinto (pulsão) sexual.
Devemos deixar claro que os instintos humanos não
predeterminam certa ação nem a forma como ela se tornará completa. Os instintos
humanos têm a função de apenas iniciar a necessidade da ação.
“Todo instinto
tem quatro componentes: uma fonte, uma finalidade, uma pressão e um objeto. A
fonte, quando emerge a necessidade, pode ser uma parte do corpo ou todo ele. A
finalidade é reduzir a necessidade até que mais nenhuma ação seja necessária, é
dar ao organismo a satisfação que ele no momento deseja. A pressão é a
quantidade de energia ou força que é usada para satisfazer ou gratificar o
instinto; ela é determinada pela intensidade ou urgência da necessidade
subjacente. O objeto de um instinto é qualquer coisa, ação ou expressão que
permite a satisfação da finalidade original.” (FADIMAN e FRAGNER, 1986, p.8)
Precisamos ainda esclarecer que Freud percebeu que
no inconsciente existe um estímulo que nos diferencia dos animais. Este
instinto foi denominado de pulsão sexual. Assim, enquanto os animais agem
impulsionados sem terem outra opção a não ser o instinto – seja pelo instinto
de sobrevivência ou de procriação –, o homem, por sua vez, se constitui de uma
diversidade de prazeres. É a essa diversidade que Freud chamou de pulsão
sexual.
O psiquismo humano está banhado por essa pulsão e é
nisso que para Freud se traduz a sexualidade: essa constante impulsão capaz de
movimentar o nosso organismo em busca da satisfação. Não há só fome na boca,
mas também libido. Assim, se a pulsão é
uma espécie de energia que leva o indivíduo à ação, aliviando da tensão
resultante do acúmulo da energia pulsional, a genitalidade é o alvo da libido,
isto é, a ação para a qual a pulsão direciona o indivíduo adulto.
Partindo desse pensamento, cito a psicóloga norte americana
Charlotte Reznick - professora da Universidade da Califórnia, em Los Angeles, e
autora do best-seller “O poder da imaginação dos seus filhos: como transformar
estresse e ansiedade em alegria e sucesso”, que afirma: “beijar os filhos na boca é “muito sexual”. Seguindo a linha
psicanalítica freudiana, a psicóloga destaca que “a boca é uma zona erógena que, ao ser estimulada, pode causar confusão
nas crianças”. Afirma ainda: “Quando
uma criança chega a 5 ou 6 anos, e começa a ter consciência sexual, o beijo nos
lábios pode ser estimulante para ela”. Esse pensamento vai de encontro com a teoria
freudiana da “fase oral” que apresenta a boca como área erógena.
O tema é polêmico, e divergente entre profissionais da
área terapêutica, mas, como psicanalista cristão, vejo com preocupação a
prática, visto que, vivemos numa sociedade onde se tenta de todas as formas destruir
o conceito de família, por meio de ampla divulgação da diversidade sexual e
como a mídia mostra que o beijo na boca entre pessoas do mesmo sexo é natural.
Se a criança é formada numa família onde essa
prática é comum, ao crescer, verá esse comportamento com naturalidade,
deturpando os bons princípios e coadunando com uma prática biblicamente
condenável.
Particularmente, vejo com muita cautela essa
prática e não recomendável na família cristã evangélica, ainda que muitos
achem que “não tem nada a ver”.
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